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Embaixador Seixas da Costa

"O Brasil faz parte do politicamente correto de qualquer programa de governo português, em matéria de política externa. Porém, no Brasil, nem com lupa alguém encontrará uma referência a Portugal num texto oficial ou particular relativo à sua a sua projeção diplomática. Má vontade? Não, apenas mero realismo."

Entrevista ao Embaixador Seixas da Costa

2015


1. São conhecidos o seu gosto pela escrita e a sua capacidade de reflexão sobre os grandes temas de política externa nos quais trabalhou - nomeadamente as questões europeias e agora, mais recentemente, as relações entre Portugal e o Brasil. Como vê o estado atual da capacidade de reflexão escrita dos diplomatas portugueses?

Continuo a pensar o que já tenho dito noutras ocasiões: os diplomatas portugueses escrevem pouco sobre as opções possíveis em matéria de política externa para Portugal e, as mais das vezes, quando o fazem, têm um tropismo excessivo para «estarem com o vento», para dizerem aquilo que acham que o poder político gosta de ler.

Não sou ingénuo: há promoções, há colocações, há boas e más vontades que é preciso mobilizar ou evitar, há nas Necessidades «capelinhas» de grupo, com chefes que não gostam da saliência dos subordinados. Sempre foi assim...

Mas a minha própria experiência - e já publiquei três livros e outro está a caminho - mostrou-me que pode ser-se, simultaneamente, disciplinado e criativo. Disciplinado, para trabalhar dentro daquilo que são as grandes opções definidas por quem tem a legitimidade de marcar as orientações do país em matéria externa. Criativo, através da apresentação de propostas e caminhos para dar substância a essas mesmas orientações e, nas áreas em que elas não existam, promover sugestões, sem com isso procurar condicionar as opções que venham a ser tomadas. E - ponto importante - respeitar e passar a defender abertamente estas em público, em absoluto, logo que definidas, sem prejuízo de, interna e discretamente, se poder fazer «subir» sugestões de correção de percurso.

Contrariamente ao que se possa pensar, não acho que a nossa revista Negócios Estrangeiros seja o veículo ideal para esses exercícios mais criativos. Nessa publicação, de natureza oficiosa, entendo que haveria toda a vantagem, até para «memória futura», que os intervenientes diplomáticos, presentes e atuantes em certos exercícios práticos, viessem a dar regular conta, mais ou menos detalhada, das ações ou negociações importantes em que estiveram envolvidos. Embora, neste caso, sem, necessariamente, terem obrigatoriamente de chegar sempre à conclusão de que Portugal acabou por sair pela porta grande, no saldo dessas aventuras diplomáticas. Mais do que elegias à glória passada, textos em que às vezes alguns parecem sair apenas aos ombros de si próprios, torna-se importante fazer o inventário dos erros, do que foi mal feito e poderia ter sido melhor executado, das opções alternativas que não se seguiram e que a experiência posterior mostrou que teriam sido melhores. Tudo isso com um bisturi crítico, profissional, informado, documentado, isento de tentações de fazer a hagiografia dos atores políticos.

Os textos mais criativos escritos por funcionários diplomáticos - e por alguns excelentes técnicos que existem no MNE - deveriam, a meu ver, ser reservados para as publicações de think tanks, como a Política Internacional, as Relações Internacionais ou outras, portuguesas ou estrangeiras. É importante ver esses órgãos de reflexão frequentados pelos nossos colegas, porque isso também faz transparecer que os seus trabalhos têm uma qualidade que é aceite num horizonte que vai para além das publicações caseiras, onde o crivo é, por óbvias razões, menor.
 

2. Foi embaixador na capital de uma potência emergente que fala português e agora regressa à Europa, para uma França que não desiste de preservar a sua influência e estatuto. Conte-nos um pouco da sua experiência no Brasil de Lula - designadamente quanto às perspetivas para o relacionamento entre Portugal e o Brasil - e partilhe as suas primeiras impressões sobre a França de Sarkozy.

O Brasil é um caso atípico no quadro das nossas relações externas. É um país com o qual Portugal tem uma das suas mais complexas e assimétricas ligações, no seu quadro internacional. O Brasil faz parte do «politicamente correto» de qualquer programa de governo português, em matéria de política externa. Porém, no Brasil, nem com lupa alguém encontrará uma referência a Portugal num texto oficial ou particular relativo à sua a sua projeção diplomática. Má vontade? Não, apenas mero realismo.

O Brasil tem um destino global que não comporta Portugal como uma alavanca relevante. Nem sequer mesmo a CPLP. Trata-se de um país que, tendo atingido um estádio de maturidade política democrática de alguma solidez, ainda que com disfunções institucionais importantes, com um perfil de desenvolvimento que o coloca já à soleira de outro modelo no mundo económico-social, com um processo interno de atenuação das desigualdades que lhe reduz progressivamente as lógicas de conflitualidade interclassista, é movido por uma saudável ambição de afirmação à escala global. Essa ambição espelha-se numa diplomacia muito preparada, consciente dos seus interesses, patriótica e orgulhosa, ativa a vários azimutes (curiosamente, sem uma hierarquia muito evidente entre eles), assente ideologicamente numa doutrina sulista (OMC, questões de desenvolvimento, Direitos Humanos), que sempre procura instrumentalizar como catalisador político da sua projeção.

Idealmente, o Brasil desejaria promover a integração sul-americana (não latino-americana, porque esse é um conceito, por várias razões, menos conveniente à sua estratégia) e partir daí para uma liderança do subcontinente, assumindo-se como contraponto, que não pretende conflitual mas convivial, com o norte do continente. Sendo essa integração sul-americana progressivamente difícil, por razões de conjuntura que dou por adquiridas, o Brasil multiplica as parcerias multilaterais ou birregionais (países árabes, países africanos, Europa, IBAS, etc.), desmultiplica-se à escala bilateral mais relevante (EUA, China, Rússia, Japão, Índia, etc.) e mostra-se em todos os tabuleiros internacionais possíveis, por vezes, irritando, com isso, alguns parceiros.

Mas o seu objetivo central, e que justifica muita da coreografia diplomática atrás desenhada, é a obtenção de um lugar de membro permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). Esse é o desiderato-chave, porque o Brasil compreendeu - e bem! - que a fixação de um lugar institucional à escala global será a prateleira inamovível em que assentará toda a estratégia para alimentar a sua ambição de futuro. E já esteve muito mais longe disso...
Onde fica Portugal aqui? Portugal vê o Brasil é um parceiro essencial para que a lusofonia, um dia, dê certo e, por essa razão, tudo fará para o manter interessado numa CPLP que Brasília ainda não viu muito bem como pode integrar na sua escala de interesses. Para o Brasil, Portugal é um amigo taken for granted na Europa e no mundo, porque o Brasil percebeu que Portugal já percebeu que acabará sempre por ser free rider do seu próprio crescimento e da sua projeção à escala global. Nenhuma afirmação estratégica do Brasil é hoje conflitual com as de Portugal e, no conjunto, Portugal e Brasil representam um jogo de sinergias com vantagens mútuas.

Sendo que, na economia, e por muito que se possa vir a progredir (investimentos, comércio, turismo), as coisas entre Portugal e Brasil não têm hipóteses de evoluir de forma muito mais significativa, em especial na presente conjuntura, é a cultura - e, neste caso, a Língua Portuguesa, sejamos realistas! - que pode vir a representar um sólido caminho comum no futuro. Tudo o que se possa pensar para além disto, depende de variáveis que seria imprudente projetar desde já.

Mas também isso passa, uma vez mais, pela efetiva consagração institucional do Brasil no quadro da ONU. E essa é, também, uma das razões pelas quais Portugal tanto tem batalhado para ajudar o seu parceiro do outro lado do Atlântico a conseguir firmar-se. O apoio essencial dado por Portugal à criação da Parceria Estratégica da UE com o Brasil aí esteve para demonstrar bem onde estamos - aliás, onde sempre estivemos, com imensa coerência de princípios e de lealdade para com o Brasil.

Você fala-me agora da França. Ainda estou na «infância» do posto em Paris, pelo que não posso ir muito longe.
A França é hoje, talvez mesmo muito mais do que há uns tempos, um eixo fundamental do futuro do processo europeu. Isso terá sido percebido pelo Presidente Sarkozy, que acabou por ser protagonista de uma Presidência da UE com grande dinamismo e bastante eficácia. Num mundo que «está à espera» da nova América, a França deixou já claro o seu interesse em romper com um certo imobilismo passado, em especial na importante questão da segurança e defesa, com a vontade de integrar militarmente a NATO - um passo que pode, com surpresa para alguns, auxiliar a um reforço da dimensão da segurança e defesa europeia.

Por outro lado, Paris pode ser vital para o trabalho, que também é essencial, de se conseguir o restabelecimento de uma relação de uma maior estabilidade com a Rússia, o que implica, simultaneamente, uma tarefa complexa junto de outros novos parceiros europeus, que têm com Moscovo uma relação mais fria e distante. França e Alemanha, porque o percurso do Reino Unido é mais incerto, podem ter um papel essencial neste descrispar de tensões com um vizinho decisivo para o futuro do continente.

Mas os desafios europeus não passam apenas por estas dimensões estratégicas de grande dimensão, situam-se noutras vertentes mais humanas e culturais, na gestão das quais a França, por um conjunto muito variado de razões, tem uma palavra muito própria a dizer. Refiro-me às políticas relativas à livre circulação, à imigração, ao tratamento das minorias, à luta contra a xenofobia e a intolerância. Sem uma França muito ativa (e positiva) nestes domínios - onde quase sempre foi um farol, quando outros estiveram bem longe - a Europa dos povos não irá longe. Este é um dos maiores testes que a França do presidente Sarkozy tem perante si própria. E, sejamos claros: se a França não estiver no eixo de uma abordagem generosa e progressista neste domínio, confesso que temo pela capacidade do resto da Europa de garantir esse percurso.

É nesta Europa ética que acho que Portugal, como porto tradicional de muitos povos e de muitas gentes, tem a obrigação histórica de afirmar uma política de forte adesão aos princípios de defesa das liberdades e da tolerância, sem quaisquer tibiezas. E espero, sinceramente, que seja possível encontrarmo-nos com a França em todos estes caminhos da defesa da civilização europeia, lutando contra os que se possam sentir tentados a desviar-se dessa leitura aberta da Europa, a única pela qual, verdadeiramente, vale a pena lutar.

Neste campo, porém, a crise que aí está pode ter, na Europa em geral, o efeito colateral de potenciar os egoísmos, de estimular os populismos, de afetar, por um protecionismo pateta e de vistas curtas, os equilíbrios de um mercado interno que deu muito trabalho construir, e onde assenta a base material de todo o projeto europeu. Esse é um projeto de solidariedades cruzadas e de vantagens/desvantagens que compete aos dirigentes políticos explicarem às suas opiniões públicas, não devendo, como frequentemente acontece, tornar Bruxelas o bode expiatório das suas fragilidades políticas internas.
Tenho esperança de vir a assistir, aqui em Paris, a uns anos de reconstrução de uma sólida política europeia, em que Portugal se possa encontrar regularmente com a França no cultivo e na promoção de uma Europa de valores.
 

3. Que avaliação faz da integração dos emigrantes portugueses em França? Foi reconhecido, nomeadamente pelo atual Presidente Sarkozy, o potencial de influência política (leia-se, votos) da comunidade portuguesa em França - quais as possíveis consequências desta realidade nas relações entre Portugal e França?

Ainda não tenho dados que me permitam ter certezas sobre o potencial daquela que é a 3ª geração portuguesa em França. Tenho feito alguns contactos, mas só daqui a algumas semanas poderei formar uma opinião mais concreta sobre o que existe, o que já foi feito e, eventualmente, sobre o que se possa vir a fazer ainda melhor.

Uma certeza tenho para mim como muito clara: a política externa portuguesa para a Comunidade portuguesa e luso-descendente em França tem de se assumir com uma forte matriz cultural e de visão estratégica. Não pode ser tentada a três coisas: a um seguidismo acrítico face aos padrões de organização de certas estruturas de enquadramento da Comunidade, o que, no passado, muito contribuiu para congelar a evolução do respetivo paradigma sociocultural; a qualquer tipo de instrumentalização política, qualquer que seja a lateralização ideológicas para que aponte; e, finalmente, à criação e alimentação de quaisquer desproporcionadas ilusões sobre o futuro papel relativo da Comunidade emigradas ou luso-descendente na sociedade portuguesa, nomeadamente no domínio económico. Deixo isto muito claro, para que não haja ilusões sobre o que vou ou não fazer.

Portugal deve imenso às suas Comunidades no exterior e, por isso, deve-lhes, desde logo, políticas de verdade, respeito pelos seus interesses e muita atenção aos seus problemas. Como em qualquer política, temos de ouvir os utentes e desenhar as soluções à luz da interpretação racional dos seus anseios.

E é isso que, em França, vou procurar fazer com a Comunidade, bem como com as novas gerações de luso-descendentes, trabalhando com estas últimas na justa medida do seu interesse em terem as estruturas oficias portuguesas a agir a seu lado, não tencionando ser patronizing e dirigista, enquadrador ou intromissor numa realidade que é, antes de tudo, francesa e deles. Faremos com essas pessoas, nomeadamente com os luso-descendentes com responsabilidades políticas a vários domínios, nem mais nem menos do que observarmos ser a sua vontade. Não pretendo projetar nenhuma tutela, nem servir de farol. Quero que isto fique claro.
Esse é, aliás, o melhor caminho para preservar a estabilidade, e até um novo vigor, se tal vier a ser viável, do excelente quadro das relações que se vivem entre Portugal e França.


4. Foi um Secretário de Estado dos Assuntos Europeus que marcou o lugar, pela conjugação de capacidade política com competência diplomática. Gostou da sua passagem pela política? Pondera nova incursão?

Cada coisa tem o seu tempo. Saí do Governo há cerca de 8 anos e já tive oportunidade de provar que não estou interessado em regressar à vida política. Hoje, a diplomacia é a minha vida, a 100%. E sê-lo-á até à minha saída da carreira, pelos imperativos da lei.

A minha passagem pela política foi um tempo muito interessante, de que me não arrependo, até porque tive o privilégio de trabalhar com imensa liberdade. António Guterres e Jaime Gama estimularam essa autonomia, sempre exercida no quadro das orientações gerais que estabeleciam. Foi um período ímpar, em que atravessei vários momentos importantes da vida europeia. Hoje, à distância, entendo que acabei por estar tempo demais no Governo, o que prejudicou a minha carreira profissional. Particularmente para quem, como eu, teve sempre - mas sempre! - como objetivo bem claro regressar à diplomacia.
Mas há uma coisa que quero que fique muito claro, até porque há muita gente que não pensa o mesmo: enquanto estive na política não fui um diplomata em comissão de serviço. Fiz apenas política. Da mesma maneira que, agora, só exerço funções diplomáticas. Como disse: cada coisa no seu tempo, sem misturas. E sempre a 100%...
 

5. Também foi sindicalista-diplomata. Quais são as questões da agenda sindical-diplomática que mais o preocupam? Que sugestões daria à ASDP?

Não posso dizer que tivesse tido uma Acão sindical destacada dentro do MNE. Fui apenas vice-presidente da direção da ASDP, por um curto período. Mas ainda me recordo de ter sido o autor dos estatutos do Prémio Aristides de Sousa Mendes, que alguns colegas queriam que viesse a ter um nome rotativo, diferente todos os anos. Ameacei demitir-me, se isso acontecesse. É que posso imaginar o que se pretendia e o que iria sair dali!

A minha vida sindical acabou de forma inesperada: estava a meio de uma reunião de direção da ASDP, quando recebi o convite para integrar o Governo... Num minuto, passei para o patronato!

Já agora, aproveito para lembrar que, aí por 1978, quando se criou a primeira estrutura associativa dos diplomatas, mobilizei vários jovens colegas com vista a evitar que a integrassem, pelo facto dos seus proponentes não quererem então qualificá-la como «sindical». Não me apetecia fazer parte de uma espécie de clube diplomático, envergonhado em assumir-se como reivindicativo. E não fiz parte dessa associação até ao dia em que ela se assumiu como uma estrutura sindical.

Tendo integrado três grupos de trabalho que prepararam e discutiram com o poder político projetos de Estatuto do Diplomata, assumo que a experiência me veio a ensinar que cometemos alguns erros, naquilo que era a suposta defesa dos interesses da carreira.

Em muitos casos, acabámos por criar «coletes de força» que protegem hoje os maus funcionários, aqueles que exploram, à letra, a panóplia de pequenos direitos que hoje enredam o quotidiano administrativo, com recursos e mais recursos, os quais, muitas das vezes, acabam por defender os medíocres e os incompetentes e criar obstáculos à progressão dos mais capazes e dedicados. É sempre preciso prevenir o arbítrio e a discricionariedade dos dirigentes, mas o sistema que hoje existe é mau, pouco transparente e está, mais do que nunca, a criar um caos no funcionamento da carreira.

O anterior Secretário-Geral teve a coragem de tentar mudar as coisas e estou certo que o atual Secretário-Geral está empenhado, com o pleno apoio de muitos de nós, em dar sequência e desenvolvimento ao produto desse excelente trabalho. O reforço do papel do Secretário-Geral, como figura central da gestão da carreira, é, a meu ver, a única solução com algumas condições de poder dar a volta à casa. Mas esse poder do SG tem de estender-se a todas as áreas do MNE e não pode haver feudos sectoriais a escaparem a esse controlo. Um estatuto e uma lei orgânica do MNE têm de cobrir todas as suas áreas. Alguma delas ficar de fora representará uma óbvia fragilidade para todo o sistema.

Quanto à carreira, devo confessar que hoje tenho a tendência a privilegiar o interesse do Estado face ao interesse individual do funcionário. Em especial, é-me completamente incompreensível que a vontade de cada um, em matéria de escolha de postos, se possa sobrepor ao interesse do Ministério em ter os funcionários que considera mais adequado em cada posto. Com as necessárias compensações de rotatividade bem expressas na lei e na prática, bem entendido. Penso que, se as coisas acabassem por ir por esse caminho no plano legal, o Ministério prestigiar-se-ia muito mais e todos acabaríamos por ganhar. Minto: não ganhariam os incompetentes, os absentistas, os calaceiros e todos quantos hoje se aproveitam do encosto às franjas da lei, do facto de fazerem parte do grupo dos amigos de X, para sobreviverem em sinecuras, mais ou menos protegidas.

Penso que a ASDP deveria centrar a sua luta na defesa das questões mais especificas da carreira: os seguros de saúde, os problemas escolares, as questões dos cônjuges, o problema dos reformados, etc. Deveria preocupar-se também com a formação contínua, com o rigor nas avaliações, com uma maior seletividade e rigor nas promoções, em tentar pôr termo às subidas de categoria por piedade, em colocar em causa a obrigatoriedade legal de saída para o estrangeiro de pessoal impreparado, em permitir uma maior flexibilidade ao Secretário-Geral para a gestão de pessoal, facilitar a introdução de meios para interromper comissões no estrangeiro de quem, manifestamente, representa mal o país.

A ASDP ganharia igualmente credibilidade se se mostrasse exigente na fiscalização severa do modo como são gastas as representações no estrangeiro, de como é tratado o absentismo e se sobrecarregam os colegas que têm de assegurar substituições, do modo como (não) se trabalha em certas áreas da Secretaria de Estado e em muitos postos.

Defender a carreira é, desde logo, defender quem trabalha bem, quem é dedicado ao serviço público, quem se esforça. Confesso que quase 35 anos de carreira me cansaram, definitivamente, dos colegas do estilo from-nine-to-five, que cada dia parece serem mais, que não estão disponíveis para ir a um aeroporto a um fim-de-semana, que acham certas tarefas abaixo dos seus pergaminhos, que não leem um livro ou um jornal, que vivem na ostentação e na preocupação de alimentar o usufruto dos sinais exteriores da carreira, que se deslumbram como patetas com o acesso social que a condição diplomática lhes concede, que abusam de forma saloia das imunidades diplomáticas, que acumulam multas de tráfego, etc.

A sensação que tenho é que a nossa estrutura sindical se encontra hoje refém de uma agenda algo burocrática, a qual se converte, sem que tal seja assumido abertamente, numa triste luta de classes etárias, angustiada a mais nova pelos estrangulamentos da carreira, menos por razões de uma procurada eficácia funcional e mais por interesses corporativos e pessoais de curto prazo, como se a ascensão ao topo fosse um direito divino. Com todo o respeito e amizade que tenho por muitos que hoje se dedicam, com empenhamento, à ADSP, entendo que mais do que assumir uma agenda seguidista, de cumulação de interesses corporativos, deveria ser assumida uma agenda reformista e radical, rumo à modernização da carreira e ao saneamento dos seus vícios. É por aqui que passa a preservação do nosso prestígio enquanto corpo profissional.
 
Perguntas por: Francisco Alegre Duarte


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Créditos: Imagem de cabeçalho da página inicial por Latino Tavares
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